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Silêncio estratégico ou medo de repercussão? Como a Comunicação Política vira refém da autocensura

Em tempos de vigilância constante e redes sociais que funcionam como tribunais de pequenas causas morais, é compreensível que políticos e assessores fiquem receosos de falar demais. Mas o que deveria ser cautela virou paralisia. E a paralisia, em política, custa caro.

Lembremos do governo Dilma Rousseff: em momentos cruciais como os protestos de 2013 ou durante o processo de impeachment, a percepção geral foi de um silêncio ou de uma comunicação reativa e defensiva, que contribuiu para o isolamento e a perda de narrativa. Não são poucos os casos em que o “melhor não postar”, “deixa pra depois” ou “isso pode dar ruim” têm substituído o planejamento estratégico por uma autocensura contínua, que esvazia projetos e mina lideranças.

A comunicação política está virando um campo minado onde o medo de desagradar pauta mais que a intenção de comunicar. Governos como o de Fernando Henrique Cardoso, com sua comunicação mais tecnocrática e cautelosa, ou o de Michel Temer, com sua formalidade institucional beirando o artificial, buscaram transmitir estabilidade, mas frequentemente foram percebidos como distantes da população.

Essa lógica não só enfraquece a identidade de candidaturas e mandatos, como entrega o terreno — limpo e pavimentado — pra quem topa o risco e fala o que pensa, ainda que seja um absurdo.

Quando o silêncio custa mais que o erro

Errar é parte do processo comunicacional. Um bom planejamento prevê crise. Uma boa equipe se prepara pra corrigir rota. Mas nenhum planejamento funciona quando tudo vira risco jurídico, perda de voto, ou “pauta negativa”. O resultado? Narrativas rasas, desconectadas da base, e uma linguagem genérica que não empolga nem convence. Vimos isso em diversas campanhas que optaram pelo “seguro” e acabaram inócuas.

E enquanto isso, figuras como Fernando Collor em 1989, com sua comunicação agressiva de “Caçador de Marajás”, ou Jair Bolsonaro, com seu estilo confrontador e sem filtros nas redes sociais, ocupam os espaços que a moderação covarde abandona. Eles falam para públicos específicos, bancam narrativas emocionais, aceitam o embate.

O campo progressista, por sua vez, mesmo com exemplos históricos de forte conexão popular como nos primeiros mandatos de Lula, por vezes tem colecionado comunicados, notas, campanhas mornas e redes sociais com medo de serem o que são, especialmente em cenários de alta polarização.

Desafio da comunicação com posicionamento

Comunicar em política não é só informar. É marcar território. É ocupar imaginário. É disputar símbolos. E isso exige, sim, saber a hora de provocar, de se antecipar, de sustentar posições que conectem com a base e com o projeto político em curso. A forma como Lula gerenciou a crise do Mensalão, alternando silêncio e confronto, ou como FHC defendeu o Plano Real, são exemplos de como, mesmo em estilos diferentes, a comunicação precisa ter um norte estratégico.

A grande virada acontece quando a comunicação deixa de ser uma extensão do jurídico – focada apenas em evitar processos ou danos imediatos – e volta a ser ferramenta estratégica de poder. Porque quem comunica com propósito — e não só com cautela — forma opinião, fideliza eleitores, e resiste melhor em contextos de crise.

Para onde olhar?

1.  Comunicação política não é publicidade institucional.

Campanhas bem-feitas com estética limpa não garantem conexão. É preciso escuta, território, repertório. A forma precisa servir ao conteúdo — e não o contrário. A comunicação de Temer, por exemplo, era formalmente correta, mas falhou em criar empatia.
2. Crie zonas de risco controladas.
Nem toda fala precisa ser “institucional”. Um projeto político precisa de personas, vozes auxiliares, ativadores. O político não precisa ser tudo. Mas precisa estar cercado de quem possa dizer o que ele não pode. Bolsonaro utilizou (e utiliza) uma rede de apoiadores e influenciadores para disseminar mensagens mais agressivas, preservando, por vezes, a figura presidencial.
3. Assuma que o conflito faz parte.
A comunicação que tenta agradar a todos vira ruído. Ser estratégico não é ser neutro. E fugir do embate é, no fim, um tipo de derrota. A ascensão de figuras que polarizam, como Collor no passado e Bolsonaro mais recentemente, mostra que parte do eleitorado responde ao confronto direto.

Em vez de silêncio, estratégia.

É hora de parar de reagir com medo e começar a comunicar com intenção. Quem não tem narrativa, acaba refém da narrativa dos outros — ou do próprio silêncio, que, como a história política brasileira desde a redemocratização demonstra, é bem mais custoso do que pare.

Gabriela Donato
Pós-graduanda em direito eleitoral e Pós graduanda em marketing político, com atuação em Direito Eleitoral e Constitucional.

Pesquisadora na área eleitoral e comunicação política.

Experiência na análise e comunicação de temas jurídicos e políticos, unindo conhecimento técnico e linguagem acessível para contribuir com o debate público e a compreensão do funcionamento do sistema eleitoral e das normas constitucionais no Brasil.

Instagram: gabrielabdonato_

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